As imagens que nos chegam da Herdade da Torre Bela, na Azambuja, não nos podem levar a outro sentimento que não choque, horror e enorme revolta, e devem fazer levantar questões sobre muitas matérias.

Importa, num primeiro passo, demarcar isto da caça de animais como a conhecemos, seja com fins gastronómicos seja em montarias. Esse é um assunto que terá de ser também discutido em breve, mas tudo a seu tempo. O que vimos naquelas imagens – centenas de animais mortos amontoados e dispostos como troféus, com sorrisos gloriosos dos responsáveis – é, acima de tudo, um massacre animal e um crime de ódio. O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) anunciou que vai suspender a licença da respetiva Zona de Caça, mas exige-se mais: um apuramento total dos factos e a condenação dos responsáveis por esta chacina.

Para além disso, as questões também se levantam no que toca à legislação das propriedades privadas como a Herdade da Torre Bela, sobretudo na matéria das atividades de caça. As propriedades privadas têm liberdade para apresentar os dados “a posteriori”, ou seja, apenas têm de informar o ICNF dos abates feitos no fim da época. Esta legislação não me parece a melhor no que toca à preservação dos habitats e à proteção da vida animal. Todas as propriedades deste tipo devem ser obrigadas a apresentar os planos do que vão caçar “a priori”, havendo penas pesadas em todo o caso de incumprimento.

Por fim, é importante também referir que está prevista a instalação de um parque fotovoltaico nesta herdade, e que seria necessário encontrar uma solução para os vários animais de caça ali existentes. No entanto, em primeiro lugar nada parece fazer justificar o extermínio dos mesmos, visto que uma transferência segura de habitat para outra herdade – a libertação em espaço aberto estava já descartada tendo em conta o património genético das espécies de veados e gamos em questão, não correspondente ao das espécies ibéricas – parecia possível, de acordo com uma avaliação preliminar no estudo de impacto ambiental. E, sobretudo, nada justifica, de forma alguma, a crueldade que se pôde registar.

Uma parte essencial da vivência em sociedade, de uma forma coletiva em que os problemas de uns são os problemas de todos, é a preservação dos ecossistemas e a relação correta, saudável e sustentável com a Natureza. Atentados à Natureza como este não podem passar em branco.


 

22 dezembro 2020

Vasco Pereira