Não é sobre flores
Luza Moura
Uma vez inserido dentro de uma sociedade, o sujeito passará por um processo de socialização, no qual aprenderá a viver nesta, a se relacionar e internalizar as regras de funcionamento. Em contrapartida, a sociedade também vai demandar do indivíduo que este assuma comportamentos e atitudes - o papel social, como a idade, sexo e posição na família.
Os papéis sociais têm valores e significados que são atribuídos pela sociedade e são resultados do processo de socialização primária (linguagem, sexo, posição na família) e secundária (assimilação de características de grupo social); constituem a identidade coletiva e a individual do sujeito.
Com a virada do século XX e o advento das duas grandes guerras, o papel da mulher sofreu transformações, visto que estas foram incentivadas a colaborar com os meios de produção para ocupar o lugar de trabalhadores homens que precisaram ir para os campos de batalha. No pós-guerra com a volta para a casa desses homens, as mulheres se viram obrigadas a reassumir um papel anterior de mãe, esposa e dona de casa. No entanto, houve uma inconformação dessas mulheres, que já não eram mais as mesmas de um período anterior. Os movimentos feministas começaram a se fortalecer denunciando que o papel feminino enquanto "sexo frágil" e "submisso" apoiados no discurso biologizante nada mais eram que construções sócio-cultural.
Pode se falar que o papel social feminino da atualidade se deu a partir de alguns acontecimentos como a entrada maciça da mulher no mercado de trabalho, o advento da pílula anticoncepcional e a influência do movimento feminista. Desde então, foram intensificados os movimentos feministas que propunham igualdade de gênero em todos os possíveis setores e áreas da sociedade. Isto corresponde a uma ausência de assimetrias no que concerne a organização social e o exercício de direitos e responsabilidades, bem como autonomia individual.
Com maior liberdade foi possível que as mulheres pudessem investir cada vez mais na sua escolaridade e formação acadêmica e, como resultado disto, as mulheres vêm se sobressaindo no mercado de trabalho. Mesmo com todo progresso da inserção da mulher no mercado de trabalho, e com todo desempenho do novo papel, a mulher ainda sofre preconceitos no que se refere a salário e função inferior a formação. Os homens ainda recebem melhores salários que as mulheres e têm progressão de carreira mais rápida que as mulheres.
Segundo o jornal económico digital Eco, a média de mulheres nos conselhos de diretores das empresas portuguesas ainda é de 22%, abaixo da média da União Europeia que ronda os 27%.
É possível perceber que dentro do âmbito trabalhista, mesmo com a transformação do seu papel social nos últimos séculos, a mulher ainda se encontra longe de alcançar igualdade de ocupação de cargos, salários e progressão trabalhista (entre muitas outras).
Dia 8 de março é o dia internacional das mulheres para que lembremos a história. Para reforçar a nossa luta. Não é sobre flores. Não é sobre homenagens. É sobre dar as mãos umas às outras e juntas ocupar lugares que há muito não nos deixam ocupar.
(Estátua "Da Cidade às Carquejeiras" do escultor José Lamas, nas Fontaínhas)